O estado do tempo, mais o montante das nossas dívidas, menos o tempo que passou desde o último Natal, vezes o tempo que já passou desde as nossas promessas de Ano Novo e que não cumprimos, elevado a uma potência correspondente aos níveis da nossa baixa motivação, a dividir pelo grau de consciência adquirida de que há uma premente necessidade para tomarmos uma atitude é uma fórmula que vi algures por aí e que define bem o que vai na alma de um cidadão a uma segunda-feira de manhã, uma coisa a que um professor da Universidade de Cardiff decidiu chamar «blue monday».
Se juntarmos a isto o facto de me terem chamado lixo na passada semana e, mais grave, eu sentir, nas tripas, que têm razão; de me lembrar que o meu escritório está a produzir um cheiro suspeito que me lembra qualquer coisa entre o cheiro de um curto-circuito e de um charroco com três semanas de frigorífico; e que houve acidente na Marginal ao Alto da Boa Viagem que ocupa duas faixas de trânsito, faz-me vacilar entre seguir para Lisboa ou meter-me na cama outra vez.
Olho pela janela e vejo dois passarinhos a cortejarem-se em cima da nespereira *. Sozinhos, saltitantes e pujantes de alegria e desejo. Para eles não há segundas-feiras azuis nem nenhum daqueles «trecos» da parafernália stressante que condiciona a catadura de um homem que tem de ir trabalhar. Um dia destes deixo crescer asas e passo a ir saltitar para o «cucuruto» de uma nespereira nas manhãs das segundas-feiras *.
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