A fotografia é feia: a Nokia, em tempos a rainha indiscutível do mundo tecnológico, com uma consistente presença global, caminha inexoravelmente para se tornar "lixo" tecnológico. Financeiramente, já o é, depois dos cortes feitos pelas agências de "rating". Comercialmente, está a ser "entalada" pelas marcas asiáticas nos modelos mais baratos e pela inovação norte-americana da Apple e Google nos topos de gama.
A imagem da Nokia está tremida como nunca: ontem, anunciou a redução para metade dos preços daquela que era vista como a sua bóia de salvação: o Lumia 900 passou a custar 49,99 dólares nos Estados Unidos. Um sinal de que está mais perto de se afundar do que o contrário. Uma decisão que se segue ao anúncio, no mês passado, da eliminação de 10 000 postos de trabalho.
O retrato financeiro da empresa assusta: as acções da ainda gigante tecnológica andam pelos valores mais baixos dos últimos 16 anos, um reflexo das perdas sucessivas que atingiram os 127 milhões de euros, no primeiro trimestre. Um valor que poderá quase duplicar no segundo trimestre, cujos dados serão conhecidos esta quinta-feira.
A crise da Nokia tem a mais simples explicação que há no mundo dos negócios: não percebeu. Não percebeu o que os consumidores queriam, não percebeu para onde ia a evolução da informação em massa, não percebeu as novas formas de comunicação, as redes sociais, a mobilidade dos conteúdos, os desenvolvimentos vertiginosos das telecomunicações. Olhou para os "smartphones" e desviou o olhar. Foi ultrapassada pela Apple, com o seu "glamour" no mundo ocidental. E foi ultrapassada pela Samsung e Google, na massificação de dispositivos associados às novas necessidades de comunicação.
O que mais impressiona nesta história é a aparente impotência de uma marca que já foi hegemónica em recuperar terreno. Aliou-se à gigante Microsoft, onde até foi buscar o seu novo presidente, Stephen Elop, o homem que a poderia salvar. Tentou apanhar o comboio dos "smartphones", mas já vai tarde. A Samsung continua a crescer e já tem quase um terço deste mercado. A Apple continua arrogantemente a fazer telemóveis caros e alegremente a controlar 25% deste segmento. E os "smartphones" continuam a encher os bolsos dos consumidores em todo o mundo, com as estimativas a apontarem para uma quota de 50% em meados do próximo ano, uma tendência completamente alheia à crise económica espalhada por vários países na crista da onda tecnológica.
A Nokia ainda tem 83 milhões de telemóveis espalhados pelo mundo. Ainda vende alguns Lumia, mas poucos. Mas se não tiver um golpe de génio, desaparecerá, talvez debaixo do chapéu Microsoft. Como está a acontecer com a Ericsson na Sony. Há dez anos, ninguém podia adivinhar este cenário. Mas em dez anos, o mundo mudou. E a Nokia pode vir a ser mais um exemplo de como, numa verdadeira economia de mercado, sem subsídios, nem monopólios, as más decisões estratégicas pagam-se. Caro.
*Editor de Empresas
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Nokia 6110. Este foi o meu primeiro telemóvel. Para mim, a Nokia será sempre um ícone. Mas tudo na vida segue as etapas de crescimento, amadurecimento, declínio e morte. Confirmei esta triste realidade com o meu filho. Eu aconselhei-o a comprar um Nokia. Acompanhei-o a uma loja e fui obrigado a confirmar que a Nokia estava ultrapassada. R.I.P.
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